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escrevo a dor e o prazer de viver vivo para escapar da morte morro e acordo cada vez mais forte

sábado, 4 de julho de 2009

Os esquecidos e os esquecimentos

Queridos e queridas,

Estava eu hoje à tarde no salão Eliese, com meus cabeleireiros -sim, no plural, pois eu tenho o privilégio de ter um casal de amigos lindos, queridos e talentosos, Régis e Eliese, e duas meninas super queridas que trabalham com eles, Lise e Michele, e todos eles cuidam de mim.
Pois eu folheava uma revista dessas que a gente lê no salão, na sala de espera do consultório, e eles, brincando, me perguntaram se eu sabia que Michael Jackson tinha morrido. Afinal, é o assunto da hora, inclusive das revistas. E lá fui eu folhear a edição especialmente dedicada a M.J.
Essa leitura não me impediu, no entanto, de ler nos jornais locais, e de acompanhar pelos diversos sites de notícias, que o ex-presidente José Sarney manda dizer ao povo que fica! Não importa se ele esqueceu de declarar ao Rei Leão que possui uma mansão, que não é Neverland. Afinal, o Excelentíssimo Senhor Atual e Duplamente Eleito Presidente da República do Brasil não se importa com tal esquecimento. Muito pelo contrário, cruzou o Atlântico para vir a uma reunião de emergência junto ao seu partido, dito de esquerda, para democraticamente afirmar Fica Sarney. E Sarney Fica.

E isso me faz voltar no tempo, e lembrar do início da fase de redemocratização do Brasil, quando Tancredo Neves seria o primeiro presidente pós-anos-de-chumbo. E veio Sarney. E veio Collor, Itamar... e nesta frágil e adolescente nação, foi eleito um operário, um trabalhador, que simbolizaria a mudança para um outro mundo possível, com menos desigualdades sociais, com menos corrupção, menos impunidade, menos colarinho branco, menos direita volver.

E neste modelo político nefasto cada vez mais me convenço da total inutilidade da existência do Senado, e emerge com mais força política, com mais poder, o ex-presidente Sarney, o vice que assumiu o lugar daquele que seria a esperança de um país realmente democrático e livre do clientelismo, da cooptação política e da subserviência aos militares.
Vejo um homem poderoso, que circula de cabeça erguida declarando que esqueceu de declarar uma mansão. E fica por isso mesmo.

Enquanto autoridades governamentais "esquecem" de declarar bens, um outro grupo de esquecidos cresce vertiginosamente no Brasil. São os sem-mansão, sem-renda, sem-teto, sem-emprego, são os sem. Como no filme Os Esquecidos (1950), uma obra-prima de Luis Buñuel, na qual um adolescente foge de um reformatório para voltar a uma vida miserável. Certamente, pessoas assim, sem poder, não podem se esquecer de nada. Por isso vão para reformatórios. presídios. Porque são pessoas comuns, reles mortais. Sem foro privilegiado, sem carteiraço, sem.

Enquanto isso, as revistas destacam a morte de M.J., aqui nos pampas se alardeia a Gripe A, os adesivos contra o Crack! (eureka! descobriram a solução, todo mundo cola adesivos e se conscientiza!), e ali, em um cantinho insignificante, como se diagramam notícias de menor importância, está o senador Sarney e sua declaração triunfante: diga ao povo que fico. E o presidente - não, não é do Sarney que estou falando - saiu da reunião que teve com lideranças de seu partido, e voltou a cruzar o Atlântico. Para Paris, de avião. As lideranças, ficaram a ver navios. Na reunião democrática, a ordem foi clara: deixem o Sarney em paz. Afinal, foi apenas um esquecimento. Ou um ato falho?
Fiquem bem, apesar de.

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