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escrevo a dor e o prazer de viver vivo para escapar da morte morro e acordo cada vez mais forte

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Em cada coração, uma saudade

Queridos e queridas,

Mudei há poucos instantes o tema para o post de hoje. Seria um comentário. Agora, espero que seja um pouco de desabafo, e um pouco de homenagem. Desabafo, porque preciso compartir esta notícia que acabei de tomar conhecimento, pelo telefonema de meu ex-marido. Meu querido vizinho morreu, hoje à tarde. Escrevi há alguns dias que vi a ambulância em frente a sua casa. Tive a sensação de que ele estava saindo daqui pela última vez. Apesar da força e vitalidade que ele tinha em seus 80 e poucos anos (acabara de completar mais um aniversário no começo deste mês), o câncer não o poupou.

Acho, também, que não foi só o câncer, mas a depressão que eu percebia que começou a tomar conta dele nestes últimos meses. Ele comentou comigo, numa das últimas vezes que conversamos pelo muro que divide nossas casas, que um amigo dele, médico, havia cansado de lutar contra a doença que o acometera, no momento em que começou a ficar refém de remédios para todas as horas, para todos os minutos de cada dia. Aquilo não era mais viver. Eu falei para ele que apesar disso, ninguém deve desistir. O recado era direto para ele. Mas quando conversei com a minha vizinha, sua companheira por mais de 50 anos, eu perguntei por que ele não ia mais para o pátio, sentar, tomar sol. Ela me disse que ele não queria mais comer, não podia mais tomar chimarrão, e tinha remédios para todas as horas do dia, espalhados por toda a casa. Eu sei que ele tinha razão. Isso não é mais viver.

Por isso, desabafo. Não tive coragem de visitá-lo no hospital. Quis e pensei em ir várias vezes. Mas ele sabia, eu sofri várias perdas, e estou tentando me recompor. Não queria vê-lo de um jeito que eu sei que ele não gostaria que eu o visse. Porque ele sempre foi forte, brincalhão, sempre com uma palavra amiga, com a discrição e a educação que fazem um vizinho ser um vizinho exemplar, e a parceria e a amizade que transformam um vizinho em um amigo.

Nos dez anos em que eu tive o privilégio de dividir opiniões, idéias e confidências no muro em conversas com ele, eu me sentia protegida, ele fazia eu lembrar de meu pai. Ele gostava muito de meus filhos, e ao mais novo dirigia-se afetuosamente como o "Comandante".

Vou guardar a lembrança da amizade, da proteção e da cortesia que ele sempre nos dispensou. Ele é uma dessas pessoas que se torna emblema da rua, do bairro, da cidade onde vive. Tenho certeza de que, por onde ele passou, amigos deixou, e algo bom plantou. Em cada coração, uma saudade.

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