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Porto Alegre, RS, Brazil
escrevo a dor e o prazer de viver vivo para escapar da morte morro e acordo cada vez mais forte

sábado, 13 de junho de 2009

Luz e paz

Queridos e queridas,

Morrer é o epílogo da vida. Para quem acredita em vida após a morte, morrer é apenas mais um capítulo, um parágrafo único. Neste sábado, Frei Rovílio Costa morreu. E já foi velado e enterrado. Soube pelo jornal. Como editora do jornal eletrônico da FACED, às vezes eu preciso comunicar o falecimento de algum servidor ou familiar. Frei Rovílio sempre lia as mensagens, e nestas, em especial, sempre enviava um e-mail com palavras de conforto espiritual aos familiares que perderam alguém que lhes era querido.

Hoje eu tive que enviar um comunicado de falecimento, pensando que Frei Rovílio não me responderá mais por e-mail. Nem atenderá gentilmente convites, como quando eu produzi uma série sobre a Faculdade de Educação nos tempos da ditadura, e lá estava Frei Rovílio, sorridente, piadista, com uma longa prosa sobre sua vida dedicada aos livros, à educação, e ao auxílio a pessoas carentes e em situação vulnerável. Frei Rovílio, que foi professor, editor, escritor, patrono da Feira do Livro de Porto Alegre, foi também agente penitenciário. Descobri naquela entrevista. Descobri que ele não fazia discurso sobre a educação; ele educava diariamente através de sua postura, seu pensamento crítico, e seu engajamento social.
A morte de Frei Rovílio me fez lembrar também da recente perda do professor Hugo Otto Beyer, em um acidente aéreo. Poucos dias antes dele morrer, estávamos combinando uma entrevista sobre o Programa Incluir, coordenado por ele, sobre a Educação Especial, dedicada às pessoas com deficiência. Ele estava contente, porque a Universidade receberia equipamentos para serem utilizados por estudantes cegos. Até hoje permanece em minha caixa de e-mails nossa última mensagem trocada, da entrevista que não houve.

O parágrafo único, ou o epílogo, impede que exista um amanhã. Tudo o que iríamos fazer depois, o que resolveríamos mais adiante, o que empurraríamos com a barriga, o que gostaríamos de ter dito, ter desdito, ter feito, ter desfeito.
A morte é, ainda assim, uma presença. A ausência daquele que parte, a lacuna que nos deixa, com uma gaveta com seus objetos que não queremos mais tocar, com seu armário que não queremos mais abrir, com sua risada que não suportamos mais não ouvir. Viver é procurar momentos de felicidade, apesar dos vincos que as perdas deixam na memória e na história de vida de cada um.
No filme Palermo Shooting, de Wim Wenders, a morte é uma figura encapuzada (Denis Hopper) que aparece na vida de um fotógrafo que procura respostas metafísicas enquanto viaja por Palermo. Em uma entrevista, Wim Wenders declarou que quando estava na Itália, abriu o jornal pela manhã e soube que Ingrid Bergman tinha morrido. Na manhã seguinte, soube que o cineasta Michelangelo Antonioni também morrera. Ambos em 30 de julho de 2007. Naquele dia, o cineasta alemão decidiu que faria este filme em memória a estes dois grandes nomes do cinema. Na cidade de Palermo, os moradores cultivam a tradição de celebrar com a "festa da morte". "Sempre me impressionou também que pessoas que estiveram muito próximas de morrer não falam exatamente com terror disso, mas comentam sobre uma luz e uma paz", falou Wenders.
Em memória ao Frei Rovílio, desejando luz e paz.

6 comentários:

  1. Rosa Hessel Silveira13 de junho de 2009 às 20:44

    Lindo texto, Giancarla! Também tenho a melhor imagem do frei Rovílio, sempre cordial, amistoso, piadista, fraterno... na antiga salinha da Educação e Realidade (8o andar), junto a um pequeno depósito de livros que lá havia... Só um reparo: ele será enterrado AMANHÃ domingo, dia 14 de junho, após a missa de corpo presente na Igreja Santo Antônio!

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  2. Também gostei do texto. Muito sensível. Cada vez que morre um educador, perdemos sua presença, mas as marcas que deixou, perpetuam uma ausência que se inscreve a cada memória. Com Frei Rivílio será assim.

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  3. Sobre a questão da presença ausente, O Roberto criou uma mensagem para a faixa da coroa de flores em homenagem ao pai falecido: "Tu vives em nós!" e assinavam os filhos, os netos e bisnetos... Precisa falar mais alguma coisa?

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  4. Não sei pq, mas o Frei Rovílio me faz lembrar do nosso pai, em muitos aspectos... Excelente o texto, Carla!!! Parabénsssssssss!!!!!!

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  5. Como disse a minha irmâ, o Rovilio foi presença na minha família dos batisados (dos meus filhos) às encomendações dos meus pais. Para mim, ele foi o melhor modelo de sacerdote, justo por viver a Epístola de Tiago " não há fé sem obras" todos os dias, com todas as pessoas.
    O Rovilio foi também o colega brincalhão, o sacerdote católico muito respeitoso com os colegas que professavam outras religiões...um colega que nos ajudava, na Psicologia da Educação, com sua infinita sabedoria sobre o ser humano. Certamente a minha vida continuará profundamente marcada pelo convívio com o Rovílio.

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  6. Este texto me faz lembrar das pessoas que amamos mas nao podemos telas conosco,me faz ter saudades de nossa infancia,e principalmente de meu amado filho,parabéns....lindo texto

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